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Possível uso de militares no lugar de concursados gera polêmica
Governo que incluir na Reforma da Previdência proposta para que militares da reserva possam ocupar cargos privativos de concursados civis.
O governo federal pretende incluir na Reforma da Previdência, que será apresentada na próxima quarta-feira, 20, ao Congresso Nacional, uma proposta para que militares da reserva possam ocupar cargos privativos de concursados civis, sem a obrigatoriedade de realização de concurso.
A informação foi publicada na última segunda-feira, 18, pelo jornal Estado de São Paulo (Estadão), que teria tido acesso a uma minuta de Reforma da Previdência. No texto do documento, há um dispositivo que prevê que uma lei estabelecerá regras específicas para que reservistas possam realizar atividades civis em qualquer órgão.
A notícia vem repercutindo negativamente entre vários representantes da sociedade. Muitos advogados alegam que a medida é inconstitucional e trata-se de uma burla ao concurso público.
⇒ O Especialista, Alexandre Prado, comenta o uso de militares no lugar de concursados
O objetivo do governo, segundo o Estadão, é suprir a deficiência de mão de obra no serviço público. Ainda de acordo com o jornal, a ideia é dar uma gratificação ou um abono para que os reservistas executem tarefas de acordo com sua especialidade. Hoje, eles só podem ser
aproveitados em funções militares ou ocupar cargos de confiança, o que limita o remanejamento.
Conforme FOLHA DIRIGIDA publicou em janeiro, dados do Ministério do Planejamento (atual Ministério da Economia) mostram que aumentou em quase 50% o número de aposentadorias de servidores da Administração Federal Direta, em comparação com o mesmo período em 2016.

(Foto: Divulgação)
Se no ano retrasado foram contabilizadas 14.563 saídas por aposentadoria na União, em 2017 o número chegou a 21.371 (46,7%). Os dados do ano passado consideram o período de janeiro a novembro, já que o Planejamento não havia fechado os números de dezembro.
O quantitativo mostra que o governo federal precisa fazer concursos públicos para diversas instituições, além de chamar aprovados de seleções válidas em 2018, para evitar o colapso de muitos órgãos, que já sofriam com grave déficit de pessoal antes das aposentadorias.
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Banco Central (BC), Ministério da Saúde, Ministério da Fazenda (incluindo Receita Federal), Polícia Federal (PRF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF) são órgãos que vêm tendo seus quadros cada vez mais reduzidos em virtude das aposentadorias, que se intensificaram, sobretudo, quando foi ventilada a Reforma da Previdência, ainda em 2017.
O INSS, que luta para abrir concurso para 7.888 vagas, talvez seja o caso mais emblemático no que tange às aposentadorias. Além de ter um déficit de mais de 10 mil servidores, outros 16 mil já reúnem as condições necessárias para passar à inatividade ainda esse ano.
Se hoje o atendimento à população já funciona precariamente, um verdadeiro colapso poderá ocorrer em curto espaço de tempo caso o INSS não receba autorização do Ministério da Economia para abrir concurso.
O orçamento da União para 2019 prevê a arrecadação de receitas por meio de concurso para a Previdência Social. Por isso, falta apenas vontade política para que o INSS possa abrir concurso este ano e reforçar seu quadro de servidores.
Há algumas semanas, o secretário de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, Paulo Uebel, afirmou que o governo federal já está estudando regras para autorizar concursos públicos.
Segundo ele, o objetivo do governo, antes de autorizar concursos, é aumentar a eficiência do serviço público, gerando economia para os cofres públicos, e fazer com que os órgãos tornem-se cada vez mais digitais, implementando processos eletrônicos internos e externos.
Se após os órgãos terem feito esse "dever de casa" ficar evidenciada a falta de pessoal, o governo autorizará os concursos que forem necessários. A ideia é priorizar a contratação de novos servidores para aquelas instituições que realmente sofrem com déficit de profissionais.
Advogados garantem que proposta é inconstitucional
Para advogados e professores de Direito entrevistados pela FOLHA DIRIGIDA, é inconstitucional a proposta de aproveitamento de militares da reserva em funções e cargos públicos civis. Para eles, a medida trata-se de uma burla à realização de concursos públicos.
Para o advogado Gladstone Felippo, que é assessor jurídico concursado do Instituto de Previdência e Assistência do Município do Rio de Janeiro (PreviRio) e professor de graduação e pós-graduação em Direito Público da Fundação Educacional Dom André Arcoverde (FAA/CESVA), a Constituição Federal não deixa dúvidas quanto à
necessidade de aprovação prévia em concurso para o exercício de cargo efetivo ou emprego público.
Para ele, a proposta esbarra em evidente inconstitucionalidade, por violar o princípio concursivo. "Ao permitir o denominado 'remanejamento', o governo pretende dar provimento a cargos públicos aos militares sem concurso, nos moldes de uma reversão, prevista no Art. 25 da Lei nº 8.112/90, que só se aplica aos civis federais aposentados. Não custa lembrar que os militares não se submetem à Lei 8.112/90", explicou.
Gladstone destaca ainda que essa medida traria graves problemas previdenciários, já que, atualmente, o militar não contribui para a aposentadoria, e ao assumir um cargo público, teria que contribuir por conta do sistema triplamente contributivo.
"Seria uma contribuição sem contraprestação direta. Portanto, a proposta viola não só a Constituição Federal, mas também o sistema previdenciário e a lei."
Para o professor de Direito Thiago Jordace, a medida não é somente inconstitucional como também antidemocrática, privilegiando uma determinada categoria.
"Não entendo como sendo medida constitucional, pois favorece somente uma parte da sociedade: os militares, em detrimento de uma política igualitária. Portanto, trata-se de uma medida de privilégio e não de igualdade democrática."
Thiago Jordace enxerga na medida uma clara burla à realização de concursos públicos. "Entendo como sendo uma medida para economizar com a contratação de servidores públicos estatutários, concedendo privilégios para uma classe em detrimento de toda a população. Em outras palavras, é uma medida para burlar a necessidade do concurso público", afirmou.
O especialista acredita que uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) deverá ser impetrada, caso realmente o governo aprova uma lei que permita a utilização de militares em cargos exclusivos de civis, sem a obrigatoriedade de realização de concurso.
"Os órgãos de fiscalização devem estar atentos a essa questão, para não flexibilizar a Constituição Federal em razão de uma necessária economia com mão de obra. Não apenas o MPF, mas todos os órgãos de fiscalização devem estar atentos para defender a Constituição. Trata-se de uma necessária manutenção da democracia", disse.
O professor de Direito Rodrigo Lélis também acredita que uma Adin seja o instrumento ideal caso o governo consiga obter, por lei, o direito de utilizar reservistas militares para ocupar cargos de concursados.
"Certamente, algum partido de oposição ou o Ministério Público, por meio do procurador-geral da República, ou até mesmo a OAB, através de seu Conselho Federal, ingressarão com ação direta de inconstitucionalidade."
Para Rodrigo Lélis, todos e qualquer cidadão também poderá buscar a anulação dessa eventual lei por meio de uma ação popular. "No entanto, enquanto está no âmbito da discussão legislativa, cabe ao Ministério Público a prevenção", disse.
Para finalizar, o professor destaca que a reserva de vagas para militares em nada se parece com a políticas de cotas em concursos públicos.
"A constitucionalidade da política de cotas em concurso público se baseia na igualdade material, ou seja, em proteger as minorias, com tratamento desigual baseado numa gama maior de direitos para chegar à igualdade. Pensando assim, política de cotas para negro, índios e deficientes atende ao reclame constitucional. Entretanto, no caso do reservista, primeiro exclui-se a mulher, e, segundo, pode pertencer a qualquer classe social ou etnia por conta da obrigatoriedade do serviço militar."
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